O anúncio do acordo entre o Mercosul e União Europeia no último dia 28/06, ocorrido em meio a tensões no comércio internacional envolvendo grandes economias mundiais, representa expressivo avanço para o livre-comércio baseado em regras e benefícios recíprocos.
O Mercosul é marcado por uma política comercial protecionista e isolacionista desde sua criação, nos anos 1990, pelo qual se manteve fechado para o resto do mundo. Ademais, não houve evolução significativa no bloco com relação a integração logística e aduaneira, o que representava verdadeiro entrave para os países membros.
A União Europeia, por sua vez, embora tenha apenas 7% da população mundial, transaciona com o resto do mundo em percentual correspondente a 20% de todo o volume global(1).
A corrente comercial entre Mercosul e União Europeia representa aproximadamente 25% de todo o comércio internacional no mundo, equivalente a 19 trilhões de euros.
A balança comercial dos países é equilibrada e as exportações provenientes do Brasil para o bloco são essencialmente de produtos minerais, correspondentes a 22% de todo o volume exportado, seguido por produtos vegetais, que correspondem a 17% e produtos alimentícios, bebidas e tabaco, que correspondem a 16% do total exportado.
De acordo com órgãos do governo(2), o acordo permitirá ao país aumentar em quase US$ 100 bilhões as exportações para a União Europeia, que atualmente é o segundo maior parceiro comercial do Mercosul, perdendo apenas para a China.
O Acordo prevê a remoção gradativa de 92% das tarifas aduaneiras dos bens exportados do Mercosul para a União Europeia, no prazo máximo de 10 anos.
Os produtos agrícolas, suco de laranja, frutas, peixes, crustáceos, óleos vegetais e café solúvel terão as tarifas eliminadas para exportação para o bloco europeu. Já para a proteína animal (carnes bovina, suína e de aves), açúcar, arroz, milho, mel e etanol foram estabelecidas as seguintes cotas:
As cotas se referem ao montante que todos os países do Mercosul terão direito a exportar. No entanto, em 2018 só o Brasil exportou 114,9 mil toneladas de carne bovina para a União Europeia (enquanto, pelo acordo, a cota para o Mercosul será de 99 mil toneladas); 263 mil toneladas de frango (contra o limite de 180 mil toneladas imposto ao Mercosul) e, por fim, o dado mais expressivo, que se refere ao açúcar: em 2018 o Brasil exportou 349 mil toneladas, sendo que todo o Mercosul terá cota de exportação limitada a 180 mil toneladas.
Ponto que pode gerar discussão é o fato de que, com a saída do Reino Unido da União Europeia , evento também conhecido como Brexit, aquele não poderá se beneficiar dos efeitos do acordo e assim, por consequência, é possível que o nível de comércio entre os países que compõem o Reino Unido e os países compõem o Mercosul diminua.
Além disso, o acordo contempla dispositivo chamado “princípio da precaução”, pelo qual, a depender da abordagem, pode ser suspendida a importação de produtos considerados suspeitos pelo uso de agrotóxicos proibidos ou cuja prática ambiental não seja satisfatória, o que preocupa o setor privado brasileiro.
Por outro lado, o acordo possibilita o acesso de produtos que o Brasil não tem relevantes volumes de exportação e que podem ser explorados, como o etanol, arroz e lácteos. Além disso, como mencionado, as exportações de suco de laranja do Brasil para a UE, que corresponderam a 646,6 mil toneladas em 2018, terão as tarifas reduzidas a zero em até 07 anos após a vigência do acordo.
Cortes especiais de carne bovina também terão a tarifa de importação na UE reduzida a zero, o que deixará o produto exportado brasileiro mais competitivo, com cortes que ainda não eram passíveis de exportação.
Além disso, o café, produto que tem potencial de aumento do valor agregado, terá as tarifas para importação pela UE reduzidas gradualmente pelo prazo de 04 anos, sendo que em 2018 foram gerados US$ 72 milhões em receita decorrente da exportação do produto para a União Europeia e a expectativa do setor(3) é que a participação do Brasil no mercado europeu aumente 30% com o acordo.
O acordo representará a redução de determinados setores e o aumento de outros, uma vez que diversos ajustes deverão ser feitos ao longo dos próximos anos. Além disso, o acordo facilitará o acesso a produtos e serviços da União Europeia, o que deve aumentar a competitividade do produto brasileiro. A diminuição de barreiras deve ainda aumentar a inserção do Brasil nas cadeias globais, o que trará reflexos positivos com relação a investimentos, emprego e renda para o país.
Por fim, o que se considera de extrema relevância no acordo são os seus reflexos na economia do Brasil. O acordo proporcionará, além da ampliação da demanda externa pelos produtos brasileiros, inovação e integração logística e aduaneira, convergência regulatória e aumento de investimento estrangeiro direto, dentre vários outros fatores. O acordo exigirá adequação de legislações e procedimentos para que o ambiente de negócios no Brasil seja mais favorável.
Ademais, serão exigidas também previsibilidade e disciplina no ambiente de negócios, o que demandará, dentre outras medidas, reformas domésticas que possibilitem tais adequações. Se espera também que este primeiro acordo relevante firmado pelo bloco sul-americano impulsione a finalização de outras negociações que estão em andamento. Com tais avanços, espera-se que o Brasil se conecte às cadeias globais de valor e torne o produto nacional competitivo no mercado externo.
Apesar dos desafios pontuais que o acordo traz, os seus reflexos positivos se sobreporão a médio e longo prazo e propulsionará a economia brasileira. Ferramentas de facilitação e melhoria da segurança nas relações comerciais internacionais já estão sendo implementadas pelo governo brasileiro, de maneira que o país está se alinhando às melhores práticas globais. Com isso em mente, os exportadores devem desde já se preparar para ter no acordo com a União Europeia uma oportunidade de crescimento e desenvolvimento de novos negócios.
(1) Anuário Eurocâmaras – CAE 2019 (voltar para a leitura)
(2) Acordo Mercosul-UE vai aumentar exportações à Europa em quase US$ 100 bi nos próximos 15 anos Acessado em 16/07/2019 (voltar para a leitura)
(3) Acordo Mercosul-UE deve favorecer exportações de café Acessado em 16/07/2019 (voltar para a leitura)