Retificação da Declaração de Importação para utilização de Ex-Tarifário.

Foto Retificação da Declaração de Importação para utilização de Ex-Tarifário.

Por Gabriella dos Santos Freitas

A utilização da redução de alíquota concedida através do Regime de Ex-Tarifário é uma realidade bastante presente nas práticas de empresas brasileiras que atuam no comércio exterior como importadoras.

Tal benefício, que pode ser pleiteado frente à Secretaria de Desenvolvimento da Indústria, Comércio, Serviços e Inovação por qualquer empresa observados os requisitos de que o bem a ser importado seja de capital (chamados BK), de informática ou de telecomunicação (denominados BIT), assim classificados na TEC (Tarifa Externa Comum do Mercosul), é concedido através da isenção tributária temporária – parcial ou total – do imposto de importação, ou seja, hipótese em que ocorre o fato gerador, porém, por concessão legal, há redução de até 100% da alíquota do referido imposto por tempo determinado.

Além das especificidades quanto à mercadoria, outro requisito para o deferimento do Ex-Tarifário é a inexistência produto nacional equivalente, o que, nos termos da Portaria ME nº 309/20191 – recentemente revisada pela Portaria ME nº 324/19 -, será verificado na fase denominada “das Contestações” através de eventual manifestação de empresas nacionais em resposta à Consulta Pública. Em havendo manifestações, a característica de “bem equivalente” será analisada de acordo, sucessivamente, com os critérios: histórico de fornecimento do fabricante, desempenho/produtividade do bem, prazo da entrega e preço da mercadoria2.

Tais critérios acima mencionados serão analisados, contudo, apenas após a Análise Preliminar do pedido de Ex-Tarifário, fase essa criada pela referida Portaria ME nº 309/193, a qual prevê que, sob competência da Secretaria de Desenvolvimento da Indústria, Comércio, Serviços e Inovação, do Ministério da Economia, deverão ser verificados e retificados eventuais equívocos na classificação fiscal e/ou na descrição das mercadorias objeto do pleito.

Devidamente superadas as fases da Análise Prévia, das Consultas Públicas e das Contestações – com a constatação de não equivalência entre os bens ou com a ausência de manifestações contrárias –, o pleito de Ex-Tarifário será então deferido por meio de sua publicação através de Portaria atualmente editada pelo Secretário Especial de Comércio Exterior e Assuntos Internacionais.

Ocorre que todo este procedimento pode vir a ser moroso4 e, dada a dinamicidade do comércio exterior e das operações pretendidas pelas empresas, muitas vezes a publicação do Ex-Tarifário acaba por ocorrer em momento posterior ao registro da Declaração de Importação. Tal situação é peculiar, pois mesmo o importador tendo agido com antecedência à importação, este pode vir a não usufruir do benefício que ele próprio pleiteou pelo simples motivo de demora na apreciação do pedido pela Autoridade competente.

Isto pois o recolhimento do Imposto de Importação se dá no momento do registro da Declaração de Importação – o qual inaugura o processo de despacho aduaneiro – e, se não houver indicação da exceção tarifária em tal documento, o recolhimento do imposto de importação deverá adotar a alíquota integral incidente.

Diante de tal anomalia, que acaba por prejudicar o importador diligente pela lentidão do procedimento administrativo do pedido, há que se interpretar as normas do direito tributário de forma a não prejudicar o contribuinte e esvair o direito alcançado durante ou mesmo depois do despacho aduaneiro.

O Código Tributário Nacional5 é claro ao determinar que a obrigação tributária se vincula ao momento do fato gerador, logo, apenas poderia se aplicar benefício fiscal vigente em tal etapa. Apesar desta ser a regra, há que se reconhecer o caráter excepcional dos casos em que pendente de análise o pedido de Ex-Tarifário, vez que, nestes casos, há possibilidade do fato gerador ocorrer em momento anterior ao da concessão do benefício.

Ora, se o pedido foi devidamente realizado pelo contribuinte em momento anterior ao registro da DI e o Ex-Tarifário foi publicado em momento posterior, certo é que, ao tempo do registro o contribuinte já preenchia os pré-requisitos para dele usufruir e, por isso, a interpretação adequada é a de que os efeitos da concessão do Regime devem ter caráter extensivo.

Assim, aquele contribuinte que tiver publicado o seu Ex-Tarifário apenas em momento posterior ao do registro da DI tem o direito de solicitar a retificação de tal documento a fim de que seja aplicado o justo benefício na operação, o que lhe gerará crédito tributário em decorrência da diferença da alíquota incidente sobre o imposto de importação.

O pedido de retificação da DI, por sua vez, poderá ser realizado durante o despacho aduaneiro ou mesmo após o desembaraço das mercadorias, sendo que, em ambos os casos, o requerimento de retificação deverá ser realizado pelo próprio exportador através do SISCOMEX, sendo tal pleito sujeito à análise e homologação pela Autoridade Aduaneira.

O entendimento sobre o direito à retificação da Declaração de Importação para o adequado uso de Ex-Tarifário se encontra consolidado dado o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça sobre o tema, que se posiciona pelo reconhecimento do direito do contribuinte frente à excepcionalidade do benefício, tal como se vê:

TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO. CONCESSÃO DE “EX TARIFÁRIO”. MERCADORIA SEM SIMILAR NACIONAL. PEDIDO DE REDUÇÃO DE ALÍQUOTA. RECONHECIMENTO POSTERIOR DO BENEFÍCIO FISCAL. MORA DA ADMINISTRAÇÃO. PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE. APLICAÇÃO. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO. SENTENÇA RESTABELECIDA.
1. A concessão do benefício fiscal denominado “Ex-Tarifário” consiste na isenção ou redução de alíquota do imposto de importação, a critério da administração fazendária, para o produto desprovido de similar nacional, sob a condição de comprovação dos requisitos pertinentes.
2. “O princípio da razoabilidade é uma norma a ser empregada pelo Poder Judiciário, a fim de permitir uma maior valoração dos atos expedidos pelo Poder Público, analisando-se a compatibilidade com o sistema de valores da Constituição e do ordenamento jurídico, sempre se pautando pela noção de Direito justo, ou justiça” (Fábio Pallaretti Calcini, O princípio da razoabilidade: um limite à discricionariedade administrativa. Campinas: Millennium Editora, 2003).
3. A injustificada demora da Administração na análise do pedido de concessão de “Ex-Tarifário”, somente concluída mediante expedição da portaria correspondente logo após a internação do bem, não pode prejudicar o contribuinte que atuou com prudente antecedência, devendo ser assegurada, em consequência, a redução de alíquota do imposto de importação, nos termos da legislação de regência.
4. A concessão do “Ex-Tarifário” equivale à uma espécie de isenção parcial. Em consequência, sobressai o caráter declaratório do pronunciamento da Administração. Com efeito, se o produto importado não contava com similar nacional desde a época do requerimento do contribuinte, que cumpriu os requisitos legais para a concessão do benefício fiscal, conforme preconiza o art. 179, caput, do CTN, deve lhe ser assegurada a redução do imposto de importação, mormente quando a internação do produto estrangeiro ocorre antes da superveniência do ato formal de reconhecimento por demora decorrente de questões meramente burocráticas.
5. Recurso especial conhecido e provido. Sentença restabelecida.
(STJ – REsp: 1.174.811 SP 2010/0005931-0, Relator: Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, Data de Julgamento: 18/02/2014, T1 – PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 28/02/2014)

TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. IMPOSTO DE IMPORTAÇÃO. EX TARIFÁRIO. RESOLUÇÃO DA CAMEX POSTERIOR AO DESEMBARAÇO ADUANEIRO. REDUÇÃO DE ALÍQUOTA. SEM EFEITOS RETROATIVOS. EFEITOS ESTENDIDOS. BENEFÍCIO POSTULADO ANTES DA IMPORTAÇÃO DO BEM. PRECEDENTES STJ.
I – Na origem, cuida-se de mandado de segurança, em caráter preventivo, impetrado contra ato coator do Senhor Inspetor Chefe da Alfândega do Porto de Paranaguá – Receita Federal do Brasil, objetivando que a autoridade impetrada realize normalmente o processamento dos despachos aduaneiros, já iniciados (em curso) ou futuros, com observância do regime “Ex-Tarifário”.
II – O Tribunal de origem, à fl. 205, ao discorrer acerca da resolução n. 8/2015 da Câmara de Comércio Exterior (CAMEX), a qual possui a legitimidade para reduzir a alíquota do imposto de importação, consignou que “a impetrante requereu a renovação do benefício ‘Ex-Tarifário’, em relação aos bens de capital que são objeto desta demanda, ao MDIC em 05/04/2016 e 17/05/2016, ou seja, antes do registro das declarações de importação (fato gerador do imposto de importação) e antes também do término da vigência da Resolução CAMEX nº 8/2015 (…)”.
 III – A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica no sentido de que as resoluções da CAMEX que reconhecem o direito à redução da alíquota do imposto de importação de determinada mercadoria não possuem efeitos retroativos, mas podem ter seus efeitos estendidos ao momento do desembaraço aduaneiro quando o benefício foi postulado antes da importação do bem, como é o caso dos autos. Nesse sentido, confiram-se: ReEsp 1664778/PR, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, julgado em 20/06/2017, DJe 26/06/2017 e AgRg no REsp 1464708/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 16/12/2014, DJe 03/02/2015 e REsp 1174811/SP, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 18/02/2014, DJe 28/02/2014) IV – Agravo interno improvido.
(STJ – AgInt no REsp: 1697477 PR 2017/0232947-5, Relator: Ministro FRANCISCO FALCÃO, Data de Julgamento: 05/06/2018, T2 – SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 08/06/2018) (g.n.) (Doc.16)

Ademais, em decorrência deste posicionamento, a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional se manifestou recentemente, através da Nota SEI nº 28/2019, no sentido de reconhecer o caráter extensivo das Resoluções CAMEX que reconhecem benefício de Ex-Tarifário incluindo tal matéria na lista de dispensa de contestar e recorrer. Segue o texto que foi aprovado conforme sugerido:

Tal orientação faz com que litígios sobre o assunto possam ser julgados de forma mais rápida, beneficiando o importador de forma a lhe garantir, via de regra, maior celeridade tanto em discussões em esfera administrativa quanto judicial sobre a extensão dos efeitos do Ex-Tarifário devidamente publicado.

Frisa-se: a discussão se pauta substancialmente no fato de que a concessão do benefício é intrinsecamente relacionada ao seu deferimento, e não ao seu mero requerimento. Em decorrência disto, portanto, o reconhecimento da extensão dos efeitos do Ex-Tarifário ao desembaraço aduaneiro, o que permite ao importador, a partir da publicação do benefício, requerer a retificação da DI para fazer constar o Regime Especial que, à época do registro da DI, apesar de já estar constituído no direito, este não havia ainda sido publicado.

Resta ao contribuinte, portanto, verificar se já não possui créditos a serem compensados/restituídos em decorrência de operações já finalizadas em que se deixou de incidir o benefício em decorrência da publicação tardia do Ex-Tarifário e da ausência de pedido de retificação da DI  ou, ainda, gerenciar não só o seu direito, mas também os riscos da operação, vez que, caso se inicie procedimento de importação relacionado à solicitação de Regime de Ex-Tarifário ainda pendente de análise pelo Poder Executivo e este não seja publicado até o registro da DI, o imposto de importação a ser recolhido deverá indicar a alíquota integral.



1 Artigo 9ª da Portaria ME nº 309/19.
2 Artigo 13 da Portaria ME nº 309/19.
3 Artigo 7º da Portaria ME nº 309/19.
4 Cumpre destacar que, apenas para a análise preliminar, à Secretaria Especial da Receita Federal é garantido o prazo de trinta dias úteis para a sua manifestação sobre eventual pleito apresentado pela Secretaria de Desenvolvimento da Indústria, Comércio, Serviços e Inovação nos termos do §2º do Artigo 7º da Portaria ME 309/19.
5 Artigos 144 e 105 do Código Tributário Nacional.

 

 

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