Em 28 de junho de 2024, foi sancionada a Lei nº 14.905, trazendo alterações importantes ao Código Civil, especificamente nos artigos que tratam do inadimplemento das obrigações tratando das perdas e danos, da mora e outros assuntos. Dentre as mudanças, está a atualização monetária e os juros através da padronização dos índices de correção monetária – pelo IPCA – e dos juros moratórios – pela taxa SELIC – que visa proporcionar maior segurança jurídica e previsibilidade financeira.
Um dos apontamentos que verificamos é que, ao unificar as regras, a Lei reduz as divergências nos tribunais sobre a aplicação dos índices para recomposição da moeda em decorrência da inflação que representa a atualização monetária e os juros, podendo ser remuneratórios, moratórios ou contratuais.
O artigo 389 passou a vigorar estabelecendo que “não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros, atualização monetária e honorários de advogado”. Em se tratando de obrigação, verifica-se que a relação entre partes está estabelecida através dos contratos e a nova lei define que, caso não as partes de um contrato não convencionem índice para atualização monetária, será aplicado o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo).
Isso é uma das novidades trazidas pela Lei: não tendo previsão específica, o contrato será automaticamente ajustado conforme as novas regras.
O novo artigo 404 indica que, quando a obrigação for paga em dinheiro, as perdas e danos – entenda-se, aqui, o que o credor efetivamente perdeu e o que deixou de lucrar – serão pagas com atualização monetária, juros, custas e honorários de advogado.
No que tange aos juros, o Código Civil estabelece que o devedor é considerado em mora quando não efetuar o pagamento no tempo, lugar e forma que a lei ou contrato estabelecer, tal como disposto no artigo 394. A nova Lei trouxe a disposição expressa de que o devedor deverá responder pelos prejuízos a que sua mora der causa, mais juros, atualização monetária e honorários.
Especificamente sobre os juros, o artigo 406 indica que, quando não for convencionado, os juros observarão a “taxa legal”. Isto é, a taxa Selic deduzindo o IPCA (ou outro definido em contrato). Desta forma, a legislação traz às relações contratuais forma definitiva para a correção monetária e os juros moratórios.
Vejamos os textos legais:
Art. 389. Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros, atualização monetária e honorários de advogado.
Parágrafo único. Na hipótese de o índice de atualização monetária não ter sido convencionado ou não estar previsto em lei específica, será aplicada a variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), apurado e divulgado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), ou do índice que vier a substituí-lo.
Art. 395. Responde o devedor pelos prejuízos a que sua mora der causa, mais juros, atualização dos valores monetários e honorários de advogado.
Art. 404. As perdas e danos, nas obrigações de pagamento em dinheiro, serão pagas com atualização monetária, juros, custas e honorários de advogado, sem prejuízo da pena convencional.
Art. 406. Quando não forem convencionados, ou quando o forem sem taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, os juros serão fixados de acordo com a taxa legal.
§ 1º A taxa legal corresponderá à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), deduzido o índice de atualização monetária de que trata o parágrafo único do art. 389 deste Código.
§ 2º A metodologia de cálculo da taxa legal e sua forma de aplicação serão definidas pelo Conselho Monetário Nacional e divulgadas pelo Banco Central do Brasil.
§ 3º Caso a taxa legal apresente resultado negativo, este será considerado igual a 0 (zero) para efeito de cálculo dos juros no período de referência.
Além disso, a referida legislação revoga a Lei de Usura (Decreto nº 22.626 de 1933), que regulava a cobrança de juros excessivos. A nova legislação estabelece que essa norma não se aplica às obrigações contratadas entre pessoas jurídicas e instituições financeiras, garantindo que as obrigações financeiras sejam ajustadas de maneira adequada.
Essa padronização garante uma base uniforme e previsível para a correção dos valores devidos, facilitando o cálculo, regulamentando as relações contratuais e proporcionando maior transparência nos processos judiciais que envolverem o tema. Por exemplo, para uma dívida de R$ 10.000,00 vencida em 1º de janeiro de 2024 e paga em 1º de janeiro de 2025, com uma Selic acumulada de 6% e um IPCA acumulado de 4%, o valor dos juros de mora será calculado deduzindo-se o valor do IPCA da Selic. Isso demonstra como a aplicação da Selic pode impactar substancialmente o valor dos débitos, tornando o processo mais claro e objetivo.
Em relação à elaboração e formalização dos contratos, é importante ressaltar que tais condições dependem da convenção entre as partes. A Lei nº 14.905/2024 estabelece que a adoção dos índices de correção monetária pelo IPCA e da taxa Selic para juros moratórios é facultativa, permitindo às partes acordarem outras formas conforme suas necessidades e acordos específicos.
Importa destacar que, caso as partes de um contrato estabeleçam outro índice, este deve estar especificado no contrato. Não pode ser algo genérico ou subjetivo. Se não houver um índice especificado, será aplicado o IPCA para correção monetária e a taxa Selic para juros moratórios, conforme as novas disposições legais. Para contratos onde está redigido “índice a critério da Contratante” ou termos semelhantes, a correção monetária e os juros serão calculados com base no IPCA e na taxa Selic, respectivamente, conforme as novas regras.
Vale lembrar que a mudança na legislação trouxe definição sobre o tema de modo que as discussões tenham fundamentos específicos. E, por isso, vemos que a mudança na legislação traz uma oportunidade para que as interessadas possam revisar seus contratos vigentes assegurando que estejam em conformidade com a nova legislação, bem verificar se os índices de correção monetária e juros estão claramente especificados para que não sejam surpreendidos em caso de descumprimento.
Adicionalmente, é prudente considerar que a utilização do IPCA e da taxa Selic está relacionada com a volatilidade econômica, vez que tais índices são altamente variáveis. Para mitigar esses riscos, é aconselhável incluir cláusulas que permitam ajustes conforme mudanças econômicas ou legislativas futuras para proporcionar maior flexibilidade e segurança jurídica.
Consideramos que a mudança na legislação representa um avanço significativo na padronização e clareza das regras de atualização monetária e juros no Brasil. No entanto, algumas críticas podem ser levantadas em relação à falta de flexibilidade para determinados setores ou contratos específicos, devendo nestes casos estarem atentos em definir previamente o índice a ser adotado.
E, por fim, considerando que a vigência da Lei nº 14.905/2024 ocorrerá, para a maioria dos dispositivos, a partir de 30 de agosto de 2024, vemos que o momento é crucial para que os contratos sejam revistos e ajustados de modo que seja garantida a conformidade com as novas disposições legais e evitem litígios futuros.
Nossa equipe está acompanhando o tema e encontra-se à disposição para solucionar quaisquer dúvidas que possam surgir.
E, analisando o assunto, apresentamos algumas respostas que nos parecem ser importantes para dúvidas frequentes:
Quando a Lei nº 14.905/2024 entra em vigor? A Lei nº 14.905, sancionada em 01 de julho de 2024, entra em vigor 60 dias após a data de sua publicação oficial. Portanto, considerando a data de sanção, a lei passa a vigorar a partir de 30 de agosto de 2024.
O que muda na correção monetária com a Lei nº 14.905/2024? A correção monetária agora será feita utilizando o IPCA na ausência de um índice específico acordado em contrato ou estipulado por lei.
Como serão calculados os juros moratórios com a nova lei? Na ausência de especificação contratual, os juros moratórios serão calculados utilizando a taxa Selic, a taxa básica de juros da economia brasileira.
Quais são as principais alterações no Código Civil com a Lei nº 14.905/2024? As principais alterações incluem a definição do IPCA como índice padrão de correção monetária e a taxa Selic como referência para os juros moratórios, além de ajustes nos artigos 389, 406 e 1.336 do Código Civil.
A Lei da Usura ainda se aplica após a Lei nº 14.905/2024? A Lei da Usura não se aplica a operações financeiras entre pessoas jurídicas e instituições financeiras.
Qual é o impacto da nova lei nos contratos vigentes? Pode ser necessário revisar e possivelmente adicionar aditivos contratuais para incorporar as novas disposições legais, ou então especificar claramente o índice desejado pela parte. Dependendo do setor comercial, pode ser considerado incluir cláusulas que permitam ajustes conforme mudanças econômicas ou legislativas futuras.
Como a Lei nº 14.905/2024 afeta os processos judiciais? A taxa de juros aplicada nos processos judiciais será a Selic, o que pode alterar substancialmente o valor dos débitos.