Fim de 2023 e as mudanças na legislação tributária

Foto Fim de 2023 e as mudanças na legislação tributária

Historicamente o final de ano traz mudanças na legislação tributária e não foi diferente em 2023. Além de promulgada a Emenda Constitucional nº 132/2023 que trata da Reforma Tributária (veja nosso artigo sobre o tema), outros temas foram objeto de mudança através das normativas editadas e publicadas pelo Governo.

Dentre as mudanças, destacamos as seguintes:

  • Medida Provisória nº 1.202/2023 publicada no último dia 28 de dezembro que, dentre outros temas, limita a compensação de créditos decorrentes de decisões judiciais transitadas em julgado;
  • A Receita Federal do Brasil publicou, no dia 29 de dezembro, a Instrução Normativa RFB nº 2.168/2023 que dispõe e regulamenta a autorregularização incentivada de tributos por ela administrados;
  • Pela publicação da Portaria MF nº 1.634, no dia 22 de dezembro, foi aprovado o novo Regimento Interno do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF);
  • Portaria Normativa MF nº 1.584, de 14 de dezembro, dispondo sobre a transação por adesão no contencioso tributário de relevante e disseminada controvérsia jurídica e de pequeno valor; e
  • Foi publicada a Lei nº 14.784/2023, também no dia 28, que prorrogou até 31 de dezembro de 2027, o adicional de 1% nas alíquotas da COFINS-Importação, tendo sido revogada no dia seguinte.

Além disso, o mês de dezembro também foi marcado por algumas decisões judiciais que envolvem questões tributárias e são relevantes para as empresas. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) julgou o Tema Repetitivo nº 1.125 e proferiu, no dia 13, decisão reconhecendo que o ICMS-ST não deve ser incluído na base das contribuições PIS e COFINS, assegurando o direito à exclusão aos contribuintes substituídos. Por sua vez, no dia 19, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que os créditos presumidos do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), incentivos fiscais concedidos às empresas exportadoras, não compõe a base de cálculo do PIS e da COFINS[1] quando do julgamento, em repercussão geral, do Tema 504.

Pois bem. As mudanças merecem comentários e faremos através dos tópicos seguintes:

  • MP nº 1.202/2023 e a limitação à compensação de créditos decorrentes de decisões judiciais transitadas em julgado

Publicada no dia 29 de dezembro de 2023, a Medida Provisória revoga os benefícios fiscais de redução tributária que haviam sido concedidos em 2021 para determinados segmentos para compensar os efeitos decorrentes das medidas de combate à pandemia da Covid-19, desonera parcialmente a contribuição previdenciária sobre a folha de pagamento, revoga a alíquota reduzida da contribuição previdenciária aplicável à determinados Municípios e limita a compensação dos créditos decorrentes de decisões judiciais transitadas em julgado.

Especificamente acerca do limite para compensação tributária, verifica-se que o texto da MP entrou em vigor na data da sua publicação com efeitos imediatos. Nesse sentido, vemos pelo artigo 4ª que altera a legislação passando a vigorar com a seguinte redação:

Art. 4º. Art. 4º A Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996, passa a vigorar com as seguintes alterações:

(…)

X – o valor do crédito utilizado na compensação que superar o limite mensal de que trata o art. 74-A.

—-

Art. 74-A.  A compensação de crédito decorrente de decisão judicial transitada em julgado observará o limite mensal estabelecido em ato do Ministro de Estado da Fazenda.

§1º. O limite mensal a que se refere o caput:

I – será graduado em função do valor total do crédito decorrente de decisão judicial transitada em julgado;

II – não poderá ser inferior a 1/60 (um sessenta avos) do valor total do crédito decorrente de decisão judicial transitada em julgado, demonstrado e atualizado na data da entrega da primeira declaração de compensação; e

III – não poderá ser estabelecido para crédito decorrente de decisão judicial transitada em julgado cujo valor total seja inferior a R$ 10.000.000,00 (dez milhões de reais).

§ 2º  Para fins do disposto neste artigo, a primeira declaração de compensação deverá ser apresentada no prazo de até cinco anos, contado da data do trânsito em julgado da decisão ou da homologação da desistência da execução do título judicial.” (NR)

Com isso, a Medida Provisória estabelece limite para que os contribuintes utilizem o instrumento da compensação tributária quando há crédito plenamente reconhecido em decisão judicial transitada em julgado e, ainda, delega ao Ministério da Fazenda a competência para estabelecer o limite mensal que poderá ser utilizado na compensação. Isso somente se aplicará para os créditos superiores a R$ 10 milhões de reais.

Trata-se de medida restritiva, vez que, para esses casos, o contribuinte terá o prazo máximo de 5 anos para apresentar a primeira declaração de compensação e, quando essa for apresentada, ficará limitado a uma compensação mensal (1/60 avos), ou seja, a partir da sua publicação, pretende-se que o contribuinte não utilize a totalidade do crédito reconhecido judicialmente, utilizando-o parcialmente e de acordo com as determinações do Estado.

Em se tratando de Medida Provisória, tal determinação depende da conversão em lei e deve ser apreciada pelo Congresso Nacional no prazo de 120 dias. Ocorre que, desde já é possível verificar que a restrição imposta provoca completo cerceamento ao direito do contribuinte de compensar crédito tributário quando já reconhecido por decisão judicial transitada em julgado.

  • RFB publica Instrução Normativa nº 2.168/2023 regulamentando a autorregularização de tributos, modalidade instituída pela Lei nº 14.470/2023.

A autorregularização incentivada é um programa de conformidade fiscal do governo federal, instituído pela Lei nº 14.740/2023, e regulamentado pela Instrução Normativa RFB nº 2.168/2023[2]. Esse programa foi instituído com o objetivo de conceder o contribuinte à regularização de tributos mediante condições especiais, tais como a não incidência de multas de moras e de ofício, assim como, redução de 100% (cem por cento) dos juros de mora.

Trata-se, portanto, de uma forma de os contribuintes regularizarem tributos que deixaram de ser pagos, podendo aderir as pessoas físicas ou jurídicas, responsáveis pelos seguintes tributos: (i) que não tenham sido constituídos até 30 de novembro de 2023, inclusive em relação aos quais já tenha sido iniciado procedimento de fiscalização; e (ii) constituídos no período entre 30 de novembro de 2023 até 1º de abril de 2024.

O prazo para adesão ao programa se iniciou no dia 02 de janeiro e se encerra no dia 1º de abril de 2024, devendo o contribuinte formalizar o requerimento via Portal e-CAC.

  • Aprovado novo Regimento Interno do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (RICARF) com a publicação da Portaria MF nº 1.634

Dentre as movimentações do Ministério da Fazenda, no final de 2023, foi aprovado o novo Regimento Interno do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (RICARF) com objetivo de dar mais celeridade e previsibilidade aos julgamentos pautado em quatro pilares: a diminuição da temporalidade dos processos aguardando julgamento; celeridade na publicação dos acórdãos; maior produtividade e especialização dos conselheiros e ampliação do direito de defesa do contribuinte e maior transparência nos julgamentos[3].

Entre as alterações, cabe ressaltar que o novo RICARF criou o Plenário Virtual estabelecendo que as sessões de julgamento poderão ser síncronas (presencial, não presencial ou híbrida) ou assíncronas por meio do Plenário Virtual, como ocorre no Supremo Tribunal Federal. Nos julgamentos assíncronos, não haverá sessão específica, cabendo aos conselheiros depositarem o relatório e votos em sistema eletrônico no prazo de cinco dias.

O sistema deverá ser aprovado e regulamentado por ato do presidente do CARF, mas verifica-se que o Plenário Virtual não julgará casos envolvendo crédito tributário de elevado valor e complexidade. Esses casos serão julgados nas sessões presenciais ou híbridas (síncronas) em que há oportunidade para sustentação oral e acompanhamento dos votos.

  • Portaria Normativa MF nº 1.584 publica a transação por adesão no contencioso tributário de relevante e disseminada controvérsia jurídica e de pequeno valor

Dentre as publicações ocorridas no mês de dezembro de 2023 está a Portaria Normativa do Ministério da Fazenda nº 1.584 que tem por objetivo dispor sobre a transação por adesão no contencioso tributário de relevante e disseminada controvérsia jurídica e de pequeno valor, revogando a normativa que antes tratava o tema.

Nesse sentido, controvérsia jurídica relevante e disseminada é tida como aquela que tenha por objeto questões tributárias que ultrapassem os interesses subjetivos da causa e, preferencialmente, ainda não afetadas a julgamento pelo rito dos recursos repetitivos.

Pelo disposto no artigo 26 e seguintes, será considerada disseminada quando se constate, alternativamente, a existência de:

  • demandas judiciais envolvendo partes e advogados distintos, em tramitação no âmbito de, pelo menos, três Tribunais Regionais Federais;
  • mais de cinquenta processos judiciais ou administrativos referentes a sujeitos passivos distintos;
  • incidente de resolução de demandas repetitivas, cuja admissibilidade tenha sido reconhecida pelo Tribunal processante; ou
  • demandas judiciais ou administrativas que envolvam parcela significativa dos contribuintes integrantes de determinado setor econômico ou produtivo.

E a relevância de uma controvérsia estará suficientemente demonstrada quando houver, alternativamente, a existência de:

  • impacto econômico igual ou superior a um bilhão de reais, considerando a totalidade dos processos judiciais e administrativos pendentes conhecidos;
  • decisões divergentes entre as turmas ordinárias e a Câmara Superior do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais; ou
  • sentenças ou acórdãos de mérito divergentes no âmbito do contencioso judicial.

Enquanto, pelo texto do artigo 30 da referida Portaria, considera-se pequeno valor “aquele cujo montante do débito inscrito em dívida ativa ou em lançamento fiscal em discussão, compreendido principal e multa, não supere, por processo administrativo ou judicial individualmente considerado, o valor correspondente a sessenta salários-mínimos; e que tenha como sujeito passivo pessoa natural, microempresa ou empresa de pequeno porte.”

A transação por adesão tem como objetivos: (i) promover a solução consensual de litígios administrativos ou judiciais mediante concessões recíprocas; (ii) extinguir litígios administrativos ou judiciais já instaurados sobre determinada controvérsia jurídica, relevante e disseminada; (iii) reduzir o número de litígios administrativos ou judiciais e os custos que lhes são inerentes; (iv) estabelecer novo paradigma de relação entre administração tributária e contribuintes, primando pelo diálogo e adoção de meios adequados de solução de litígio; e (v) estimular a autorregularização e a conformidade fiscal.

Trata-se de transação por adesão, sendo que a oferta ocorrerá mediante edital a ser pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional ou pela Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil por ato isolado ou conjunto dos órgãos a depender do caso.

  • Publicada a Lei nº 14.784/2023 que prorrogou até 31 de dezembro de 2027, o adicional de 1% nas alíquotas da COFINS-Importação (e revogada no dia seguinte?).

Em 28 de dezembro de 2023, foi publicada no Diário Oficial da União a Lei nº 14.784 que, dentre outras providências, prorrogou até 31 de dezembro de 2027, o adicional de 1% nas alíquotas da COFINS-Importação.

O acréscimo de um ponto percentual de alíquota da COFINS-Importação teria vigência até o fim de 2023, mas a nova lei determinou que o acréscimo seria prorrogado até 31 de dezembro de 2027 passando a ter vigência apenas no dia 1º de abril de 2024, conforme o disposto nos texto abaixo:

Lei 14.784/2023

Art. 3º – O caput do § 21 do art. 8º da Lei nº 10.865, de 30 de abril de 2004, passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 8º – (…)

§ 21. Até 31 de dezembro de 2027, as alíquotas da Cofins-Importação de que trata este artigo ficam acrescidas de 1 (um) ponto percentual na hipótese de importação dos bens classificados na Tipi, aprovada pelo Decreto nº 11.158, de 29 de julho de 2022, nos códigos: (…)”

(…)

Art. 7º Esta Lei entra em vigor:

I – na data de sua publicação, quanto aos arts. 1º, 2º, 4º e 5º; e

II – no primeiro dia do quarto mês subsequente ao de sua publicação, quanto aos arts. 3º e 6º.”

Desse modo, os importadores sujeitos ao recolhimento da COFINS-Importação ficariam desobrigados ao acréscimo de 1% sobre a contribuição entre o período de de janeiro a 31 de março de 2024, vez que o disposto no artigo 7º acima indica que a vigência se dará no primeiro dia do quarto mês subsequente ao da publicação – se publicada em dezembro/23, a vigência se iniciaria em abril de 2024.

Contudo, no dia seguinte à publicação da Lei, foi publicada a Medida Provisória nº 1.202 (já comentada anteriormente), trazendo completa confusão e insegurança jurídica ao tema, vez que revogou a partir de 1º de abril de 2024 a incidência do adicional de 1% da COFINS e, também, a prorrogação até 2027 – vejamos o texto:

Medida Provisória nº 1.202/2023

Art. 6º  Ficam revogados:

II – em 1º de abril de 2024:

a) o § 17 do art. 22 da Lei nº 8.212, de 1991;

b) o § 21 do art. 8º da Lei nº 10.865, de 30 de abril de 2004;

c) os art. 7º a art. 10 da Lei nº 12.546, de 14 de dezembro de 2011; e

d) a Lei nº 14.784, de 27 de dezembro de 2023.

É preciso que o tema seja acompanhado pelos importadores, tendo em vista que, em sendo Medida Provisória, tal determinação depende da conversão em lei nos próximos 120 dias. Caso o Congresso Nacional não realize essa conversão em lei, a cobrança do adicional de 1% da COFINS-Importação se manterá até 2027.

  • Julgamento do STJ sobre não inclusão do ICMS-ST na base das contribuições PIS e COFINS

Ainda estando o acórdão pendente de publicação, o STJ entendeu que o ICMS-ST não integra as bases de cálculo das contribuições PIS e da COFIS quando do julgamento do mérito em sistemática de recursos repetitivos – significa dizer, portanto, que tal entendimento deverá ser aplicados aos casos idênticos pelos tributais e, também, pelo CARF.

Tal entendimento seguiu aquele já definido pelo STF quando do julgamento da “tese do século” e tratava da não inclusão do ICMS na base de cálculo das referidas contribuições. Tem-se, assim, unificação de entendimento acerca do tema.

Isto, pois o ICMS-ST não se encaixa no conceito de faturamento ou receita para fins de incidência do PIS e da COFINS, o que beneficia os contribuintes e permite a recuperação tributária dos pagamentos indevidos realizados.

  • Plenário do STF decidiu que os créditos presumidos do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), incentivos fiscais concedidos às empresas exportadoras, não compõe a base de cálculo do PIS e da COFINS

A tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) determina que “os créditos presumidos de IPI, instituídos pela Lei nº 9.363/1996, não integram a base de cálculo da contribuição para o PIS e da COFINS, sob a sistemática de apuração cumulativa (Lei nº 9.718/1998), pois não se amoldam ao conceito constitucional de faturamento”.

Para as empresas produtoras e exportadoras, a legislação assegura o crédito presumido do IPI incidentes nas aquisições de matérias-primas, produtos intermediários e materiais de embalagem que sejam utilizados no processo produtivo e adquiridos no mercado interno. É uma forma de benefício fiscal com o intuito de incentivar a exportação das mercadorias produzidas no Brasil e se aplica àquelas empresas sob a sistemática cumulativa do PIS e da COFINS.

De acordo com a notícia divulgada pelo site do STF, o caso foi julgado sob a sistemática da repercussão geral (RE 593554 – Tema 504) analisando o questionamento feito pela União Federal de uma decisão proferida pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF 4) de que “os créditos recebidos por uma empresa de equipamentos agrícolas, decorrentes da aquisição no mercado interno de matérias-primas, produtos intermediários e materiais de embalagem, quando utilizados na elaboração de produtos destinados à exportação, não constituem renda tributável pelo PIS e COFINS”.

Trata-se do mesmo mérito proferido anteriormente pelo STF quando julgou a “tese do século” e, também, pelo STJ no tópico anterior: não se encaixa no conceito de faturamento ou receita o crédito presumidos de IPI decorrente da venda de mercadorias ou prestação de serviços. Por esse motivo, não há fundamento para que o valor do crédito presumido seja incluído na base de cálculo do PIS e da COFINS, o que reduz a carga tributária dos exportadores e permite a recuperação dos pagamentos já realizados.

Diante de novas legislações e dos julgados proferidos pelos Tribunais Superiores, é perceptível que o cenário tributário é bastante complexo e traz inúmeras mudanças que merecem ser analisadas e acompanhadas. O time DJA se coloca à disposição para esclarecimentos sobre os temas compartilhados.

***

[1] Notícia disponível em: https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=523927&ori=1. Acessado no dia 17/01/2024.

[2] Perguntas e respostas disponível em: https://www.gov.br/receitafederal/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/perguntas-e-respostas/autorregularizacao-incentivada/autorregularizacao-incentivada-perguntas-e-respostas.pdf. Acessado em 17/01/2024.

[3] Notícia disponível em: https://carf.economia.gov.br/noticias/2022-1/conselho-administrativo-de-recursos-fiscias-tem-novo-regimento-interno. Acessado dia 17/01/2023.

 

RECEBA NOSSOS CONTEÚDOS

Fique conectado com a DJA. Nós enviamos regularmente conteúdo de impacto para seus negócios com inteligência aduaneira e tributária.