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Autor:
DIEGO LUIZ SILVA JOAQUIM
Este artigo tem por objetivo apresentar as mudanças trazidas pela Receita Federal do Brasil nos procedimentos de controle das importações e exportações com a publicação da Instrução Normativa RFB nº 1.678/2016 que, segundo notícia da própria autoridade federal, é resultado da “necessidade de atualização da norma, para tornar o procedimento mais eficaz, tendo em vista a dinâmica das operações de comércio exterior e a evolução das práticas comerciais”[1].
Os procedimentos especiais de controle aduaneiro estão previstos nas Instruções Normativas nº 228/2002 e 1.169/2011 que, respectivamente, dispõem sobre o controle da origem de recursos nas operações de comércio exterior e o controle na importação e exportação de bens e mercadorias, sendo que ambas foram objeto das alterações trazidas pela IN/RFB nº 1.678/2016 que entrará em vigor a partir do dia 21/02/2017.
Em caráter preambular às referidas mudanças, importa destacar que os procedimentos aduaneiros para controle das importações e exportações podem ser motivo de grande preocupação por parte das empresas que operam no comércio exterior. Reforço que “podem”, uma vez que as irregularidades a serem investigadas no âmbito de tais normativas não encontram guarida nas operações daquelas empresas que praticam o compliance.
A atividade administrativa nas operações de comércio exterior por parte da Receita Federal – órgão Federal integrante do Ministério da Fazenda –, encontra amparo no artigo 237 da Constituição Federal[2] e busca a manutenção fundamental da soberania nacional.
Como veremos a seguir, os procedimentos de controle das importações e exportações foram instituídos pela RFB como forma de impedir irregularidades que resultem na aplicação do perdimento das mercadorias – eis o ponto em comum entre as Instruções Normativas nº 228/02 e 1.169/11, sendo a primeira normativa relacionada com a atividade empresarial, enquanto a segunda, com as mercadorias e bens. Inclusive, tendo em vista a gravidade das sanções, suas consequências, e as inconstitucionalidades que entendemos envolver o processo de perdimento de mercadorias, é necessário que aqueles que operam no comércio exterior entendam a origem e possível resultado das fiscalizações.
A IN nº 228/02 dispõe sobre o procedimento especial de verificação da origem dos recursos aplicados em operações de comércio exterior e combate à interposição fraudulenta de pessoas e, previamente à abordarmos as mudanças trazidas pela IN RFB 1.678/16, vejamos que o Regulamento Aduaneiro (Decreto nº 6.759/2009), em seu artigo 689, §6º, estabelece que haverá interposição fraudulenta presumida pela não-comprovação da origem, disponibilidade e transferência dos recursos empregados nas operações de comércio exterior.
Neste contexto e verificando que não falamos de crédito tributário, mas sim de penalidade pura e simples, podemos atribuir ao Direito Aduaneiro as características do Direito Penal. Ora, se assim o fizermos, veremos que a presunção de inocência deixa de valer para as operações de comércio exterior. Desse modo, as alterações trazidas à IN nº 228/02 merecem atenção.
Levando em consideração que presumir significa “conjecturar; supor”, a empresa importadora e/ou exportadora poderá, portanto, ser submetida à Procedimento Especial sob argumento de que a Fiscalização, baseada em certas probabilidades, entende haver interposição fraudulenta em suas operações.
A nova IN trouxe mudanças ao artigo 1º da IN nº 228/02 para descrever que “a empresa que apresentar indícios de interposição fraudulenta de pessoas, mediante incompatibilidade entre os volumes transacionados no comércio exterior e a capacidade econômica e financeira, ficará sujeita ao procedimento especial de fiscalização (…)” (grifamos) E, fazendo a leitura desse novo texto acompanhada do estabelecido pelo Regulamento Aduaneiro, podemos concluir que indícios de interposição fraudulenta poderão ser presumidos pela Autoridade Fiscal. Percebemos, portanto, tratar-se de uma incoerência legislativa.
Além disso, novamente em paralelo com o Direito Penal, vemos que o Código de Processo Penal conceitua, no artigo 239, que “considera-se indício a circunstância conhecida e provada, que, tendo relação com o fato, autorize, por indução, concluir-se a existência de outra ou outras circunstâncias” (grifamos).
Sob nosso olhar, portanto, a alteração trazida pela IN nº 1.678/16 evidencia que o início de procedimento especial de fiscalização com fundamento na IN nº 228/02 dever-se-á ter por base a comprovação fática-documental da incompatibilidade entre volume de transação e capacidade econômica e financeira, sob pena de praticar ato administrativo evidentemente nulo.
Houve, também, alteração no artigo 3º que passará a dispor o seguinte:
“Art. 3º O procedimento especial de fiscalização previsto nesta Instrução Normativa será instaurado, no curso de procedimento de fiscalização amparado por Termo de Distribuição de Procedimento Fiscal de Fiscalização (TDPF-F) de que trata a Portaria RFB nº 1.687, de 17 de setembro de 2014, mediante termo de início, com ciência da pessoa fiscalizada, contendo as possíveis irregularidades que motivaram a instauração. Links para os atos mencionados
Parágrafo único A empresa, cuja omissão na entrega de declarações fiscais a que estiver obrigada prejudicar a avaliação da sua capacidade econômica e financeira, ficará sujeita ao procedimento especial de fiscalização na forma estabelecida no caput.”
Vemos, pela simples leitura do mencionado artigo, que o Procedimento Especial de Controle previsto pela IN nº 228/02 será iniciado no curso do procedimento de fiscalização amparado pelo TDPF-F (Termo de Distribuição de Procedimento Fiscal de Fiscalização). Tratam-se, portanto, de dois procedimentos distintos:
Considerando que os atos da Administração Pública estão vinculados com o princípio constitucional da estrita legalidade, qualquer inobservância dos procedimentos poderá resultar em prejuízo à empresa investigada. Em especial, pois, uma vez que os procedimentos ocorram de forma contrária à legislação – inclusive a falta de intimação –, não haverá o que se falar em aplicação da pena de perdimento, ou, ainda, retenção das mercadorias.
Seguindo com as alterações trazidas pela IN RFB nº 1.678, o artigo 4º da IN nº 228/02 passou a exigir que a empresa investigada, durante o procedimento de fiscalização (que, nesse momento, já reteve mercadorias importadas e a empresa importadora arcará com enormes prejuízos por consequência) seja intimada para “comprovar” os indícios que basearam o início do procedimento e que foram presumidos.
Ora, em que pese entendermos necessário a existência do controle aduaneiro para assegurar a segurança na entrada e saída de mercadorias no território nacional, nos parece evidente que o tema interposição fraudulenta sofre de conflitos conceituais e a burocratização trazida pela IN RFB nº 1.678/2016 poderá acarretar maior prejuízo aos importadores e exportadores do que a esperada contenção de irregularidades aduaneiras.
Por outro lado, a IN RFB nº 1.678/2016 trouxe em suas alterações à IN SRF nº 228/02, a segurança jurídica de que as mercadorias poderão ser desembaraçadas durante o procedimento fiscal mediante garantia, salvo se esta não seja efetiva para assegurar os interesses da União Federal e que ocorrerá mediante despacho fundamentado (novo texto do artigo 7º, §5º). E reforçou, também, que o procedimento deverá ser concluído no prazo de 90 (noventa) dias, sendo possível sua prorrogação em situações devidamente justificadas.
Com relação ao prazo para o procedimento, a IN nº 1.678/16 trouxe, como novidade, o §1º para o artigo 9º que assim passará a dispor: “O prazo referido no caput terá sua contagem iniciada na data em que as importações começarem a ser direcionadas para o canal cinza de conferência aduaneira por força do procedimento especial em curso, caso essa data seja anterior à ciência do termo de início”.
Vemos, desta forma, que a novidade beira ao absurdo jurídico, pois a empresa que tenha o Procedimento Especial iniciado passará a ter todas suas importações direcionadas ao canal cinza e estará sujeita aos prazos da IN RFB nº 228/02. Ora, enterra-se a presunção de inocência para instituir a presunção de indícios. Entendemos que há enorme espaço e argumentos concretos para reverter referida determinação na esfera Judicial. Contudo, vale complementar o que dissemos na introdução, o compliance que já era, ao nosso modo de ver, essencial para as operações de comércio exterior, passa a ser imprescindível.
Continuamos. A mudança trazida ao artigo 11 amplia e diferencia as consequências quando da conclusão do procedimento especial, sendo que além da aplicação da pena de perdimento das mercadorias, quando: I – restar comprovada a ocultação do verdadeiro responsável pelas operações, terá aplicada, também, a multa de 10% sobre o valor da operação com mínimo de R$ 5.000,00 (cinco mil reais)[4], e manteve o procedimento para inaptidão do CNPJ na hipótese da interposição fraudulenta.
Nesse ponto, poderíamos discorrer acerca do princípio do “non bis in idem” considerando as penalidades aplicadas à mesma empresa. Somos da opinião de que a legislação deveria diferenciar a aplicação da penalidade para cada um dos envolvidos na operação. Afinal, como poderia o importador que teve o procedimento concluído pela comprovada ocultação do verdadeiro responsável pela operação, arcar com a pena de perdimento (e, com a consequência da Representação Fiscal para Fins Penais) e multa, se seus atos justificariam somente a multa?
Por fim, a pretexto de garantir a celeridade dos procedimentos, foi reduzido o prazo para que a fiscalização lavre, após concluído o procedimento especial, o respectivo auto de infração. Passou de 180 (cento e oitenta) para 90 (noventa) dias, sob pena de extinção da garantia.
A IN nº 1.678/16 trouxe, também, mudanças para a IN RFB nº 1.169/2011 que “estabelece procedimentos especiais de controle, na importação ou na exportação de bens e mercadorias, diante de suspeita de irregularidade punível com a pena de perdimento”. Em notícia veiculada pela Receita Federal, as alterações foram feitas para que houvesse coerência das normas nos seguintes termos:
“Dentre as situações que ensejam a abertura de procedimento especial de controle disciplinado pela Instrução Normativa nº 1.169, de 29 de junho de 2011, existem situações similares às que ensejam a abertura do procedimento especial de fiscalização, disciplinado pela IN nº 228, de 2002. Nesses casos, deve haver coerência entre as normas, no que se refere ao tratamento dispensado às mercadorias. Por isso, incluiu-se na IN nº 1169, de 2011, a possibilidade de liberação das mercadorias mediante prestação de garantia. (…)”[5]
Assim como disposto pela IN nº 228/02, o procedimento especial de controle previsto na IN RFB nº 1.169/2011 também resulta na pena de perdimento, sob suspeita de irregularidade, nesse caso, da própria mercadoria. Para esses procedimentos, a IN RFB nº 1.678/16 alterou a redação dos artigos 9º e 10 e acrescentou os artigos 5º-A e 10-A.
A mudança do artigo 9º se trata da inclusão do II ao §2º que passou a permitir a aplicação da multa de 100% (cem por cento) sobre o valor aduaneiro da mercadoria que tenha sido liberada mediante garantia e não seja encontrada, no caso do importador deixar de responder, no prazo de 60 (sessenta) dias qualquer intimação durante o procedimento. Já no artigo 10, estabeleceu a possibilidade de que, concluído o procedimento, seja aplicada a pena de perdimento ou multa, caso as mercadorias não sejam localizadas, tenham sido consumidas ou revendidas.
A novidade trazida pelo artigo 5º-A se refere à liberação das mercadorias mediante garantia durante o procedimento especial nos casos de “ocultação do sujeito passivo, do real vendedor, comprador ou de responsável pela operação, mediante fraude ou simulação, inclusive a interposição fraudulenta de terceiro” e “no caso de suspeita da existência de fato do estabelecimento importador, exportador ou de qualquer pessoal envolvida na transação comercial”. Não há essa permissão para os casos previstos no artigo 2º, incisos I (falsidade material ou ideológica dos documentos), II (falsidade ou adulteração de característica essencial da mercadoria) e III (importação proibida).
Para esses casos, o §1º do artigo 5º-A prevê a prestação de garantia equivalente ao valor aduaneiro da mercadoria (preço acrescido do frete e seguro internacional), podendo ser na forma de depósito, fiança bancária ou seguro, sendo que a garantia será fixada no prazo de 10 (dez) dias a contar do pedido do importador, podendo ser recusado em despacho fundamentado e segue as mesmas exigências previstas para o procedimento da IN nº 228/02.
Por fim, o artigo 10-A estabeleceu o que ocorrerá com a garantia depois de concluído o procedimento especial de controle aduaneiro.
Diante das mudanças trazidas pela IN RFB nº 1.678/16, é possível concluirmos que as mudanças trazidas pela Receita Federal foram divulgadas como necessárias para adequação da legislação à realidade, inclusive, nas questões de liberação da mercadoria mediante apresentação de garantias. Nesse contexto, há diversas decisões judiciais garantindo ao importador a liberação de suas mercadorias ainda durante os Procedimentos Especiais de Controle.
Por outro lado, há que se observar a necessidade do compliance devidamente instituído nas operações de comércio exterior das empresas. De qualquer modo, concluímos que a referida IN trouxe dispositivos que encontram fundamentos e pontos a serem questionados, tendo em vista que podem causar prejuízos financeiros irreparáveis aos importadores, como é o caso da parametrização automática para o canal cinza durante o procedimento, a forma de início dos procedimentos que prejudicará os importadores se não forem fielmente cumpridas.
E, para finalizarmos o assunto e em que pese argumentos contrários, nossa percepção é no sentido de que a IN RFB nº 1.678/16 trouxe o respaldo legislativo para que o controle aduaneiro fosse feito de forma presumida. Havemos de acompanhar o controle da fiscalização após o início da vigência da referida normativa para assegurar que os procedimentos sejam realizados de forma a assegurar a observância e aplicação concreta das garantias constitucionais. Caso assim não se faça, o Poder Judiciário sempre será opção.
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Referências Bibliográficas:
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[1] Fonte: http://idg.receita.fazenda.gov.br/noticias/ascom/2016/receita-federal-estabelece-procedimentos-de-controle-na-importacao-e-exportacao-de-bens
[2] Constituição Federal, artigo 273: “A fiscalização e o controle sobre o comércio exterior, essenciais à defesa dos interesses fazendários nacionais, serão exercidos pelo Ministério da Fazenda”
[3] Decreto nº 70.235/72, artigo 7º: “O procedimento fiscal tem início com: I – o primeiro ato de ofício, escrito, praticado por servidor competente, cientificado o sujeito passivo da obrigação tributária ou seu preposto; II – a apreensão de mercadorias, documentos ou livros; III – o começo de despacho aduaneiro de mercadoria importada. (…)”
[4] Artigo 33, da Lei nº 11.488, de 15 de junho de 2007.
[5] Fonte: Sítio da Receita Federal: http://idg.receita.fazenda.gov.br/noticias/ascom/2016/receita-federal-estabelece-procedimentos-de-controle-na-importacao-e-exportacao-de-bens. Acessado em 03/02/2017.
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