Denúncia espontânea como ferramenta aduaneira

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Por Diego Luiz Silva Joaquim[1]

Com objetivo de explorar o conceito e os entendimentos majoritários sobre o instituto da denúncia espontânea, este artigo explorará algumas decisões administrativas e judiciais para apresentar a aplicabilidade dessa ferramenta para as irregularidades havidas nas operações de comércio exterior.

Para isso, é imprescindível que tenhamos em mente a associação da denúncia espontânea com o arrependimento e o cumprimento das obrigações inadimplidas. Como trataremos a seguir, há posicionamento de que a denúncia espontânea deve vir acompanhada da respectiva retratação, ou seja, há que se corrigir o ilícito tributário ou remediá-lo.

  1. Introdução

Instituto consagrado no Direito Tributário, a denúncia espontânea está prevista no artigo 138 do Código Tributário Nacional que permite a exclusão da responsabilidade tributária em casos de infração, quando o contribuinte interessado apresentar – sem forma específica – o ilícito ao Fisco.

Define o mencionado artigo: “A responsabilidade é excluída pela denúncia espontânea da infração, acompanhada, se for o caso, do pagamento do tributo devido e dos juros de mora, ou do depósito da importância arbitrada pela autoridade administrativa, quando o montante do tributo dependa de apuração”.

Significa dizer, então, que a denúncia espontânea é o instrumento que permite a exclusão da responsabilidade tributária através da permissão legal aos contribuintes para que apontem o ilícito cometido, acompanhado do respectivo pagamento, antes de qualquer providência do Fisco.

Nesse sentido, merece destaque os comentários de Leandro Paulsen sobre o escopo da denúncia espontânea:

“O objetivo da norma é estimular o contribuinte infrator a colocar-se em situação de regularidade, resgatando as pendências deixadas e ainda desconhecidas por parte do Fisco, com o que este recebe o que lhe deveria ter sido pago e cuja satisfação, não fosse a iniciativa do contribuinte, talvez jamais ocorresse. A previsão legal é absolutamente consentânea com uma estrutura tributária incapaz de proceder à fiscalização efetiva de todos os contribuintes e que precisa, demais, estimular o cumprimento espontâneo das obrigações tributárias, seja tempestivamente, seja tardiamente. Na medida em que a responsabilidade por infrações resta afastada apenas com o reconhecimento e cumprimento da obrigação, preserva-se a higidez do sistema, não se podendo ver nela nenhum estímulo à inadimplência”[2].

Trata-se, portanto, de instrumento garantindo em lei para motivar os contribuintes infratores a traçar o caminho da regularidade de maneira sincera, autêntica e definitiva. Podemos encarar esse instrumento, em um paralelo com ferramentas de gestão e compliance, como uma técnica para correção de vulnerabilidades como foco na conformidade.

Podemos chama-la, portanto, de “instrumento de autorregularização” – buscado, inclusive, por programas específicos como “NOS CONFORMES” da Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo; ou “PRÓ-CONFORMIDADE” da Receita Federal do Brasil.

  1. Condições definidas em lei

Como rapidamente mencionado, o Código Tributário não prevê forma específica para que o contribuinte informe sua irregularidade ao Fisco, mas exige que tal notícia seja acompanhada da respectiva regularização.

Em que pese haja previsão legal para o arrependimento como forma excludente de responsabilidade tributária, há que apontar que tal instrumento possui, de certo, condições estritas a serem cumpridas. Isto é, a notícia da irregularidade deve vir acompanhada da regularidade do ilícito ou pagamento dos tributos devidos e juros de mora.

O que se extrai do texto legal previsto no artigo 138 do CTN é que a notícia da infração tem como encargo fundamental a regularização. Eis um ponto de impasse: a legislação aponta a expressão “se for o caso” no texto da lei o que, repercute na discussão se a denúncia espontânea pode ser aplicada às obrigações acessórias.

Penso que o entendimento majoritário da jurisprudência é no sentido da inaplicabilidade da denúncia espontânea às obrigações acessórias, como se pode ver pelo julgado abaixo preferido pelo Superior Tribunal de Justiça:

“TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. MULTA ADMINISTRATIVA. APREENSÃO DE EQUIPAMENTO. OBRIGAÇÃO ACESSÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. DENÚNCIA ESPONTÂNEA. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211/STJ. .

(…)

2. O STJ possui entendimento de que a denúncia espontânea não tem o condão de afastar multa administrativa pela apreensão de equipamento não autorizado, pois os efeitos do art. 138 do CTN não se estendem às obrigações acessórias autônomas. Precedente: AgRg no REsp 1.466.966/RS, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 11/5/2015.

3. Recurso Especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido.”[3] (grifamos)

Contudo, há doutrinadores que se posicionam contrários à tal entendimento pugnando pela aplicabilidade do instituto à denúncia espontânea:

“Sendo a obrigação tributária acessória a nomenclatura adotada pelo Código Tributário Nacional para deveres administrativos ou instrumentais de natureza não patrimonial, e de que não resultem falta ou insuficiência de tributo, a correção dos atos comissivos ou omissivos errados, ou até mesmo viciados com falsidade, desde que anteriormente ao início de uma inspeção fiscal, também produzirá o efeito de elidir a penalidade.”[4] (grifamos)

“Como a lei diz que a denúncia há de ser acompanhada, se for o caso, do pagamento do tributo devido, resta induvidoso que a exclusão da responsabilidade tanto se refere a infrações das quais decorra o não pagamento do tributo como a infrações meramente formais, vale dizer, infrações das quais não decorra o não pagamento do tributo. Inadimplemento de obrigações tributárias meramente acessórias. O cumprimento de uma obrigação acessória fora do prazo legal configura nitidamente uma forma de denúncia espontânea da infração, e afasta, portanto, a responsabilidade do sujeito passivo.[5] (grifamos)

Nesse paradigma, nos deparamos com as operações aduaneiras que, por estarem envoltas por diversas obrigações acessórias – sem o pagamento de tributos – havemos que explorar a aplicação da denúncia espontânea para esses casos.

  1. Denúncia espontânea em matéria aduaneira

Corroborando o entendimento até então apresentado, a denúncia espontânea aplicada às operações de comércio exterior não só está pautada no artigo 138 do CTN, como possui disposição legal específica.

É sabido que o Direito Aduaneiro, como ramo autônomo, possui regramentos específicos, dentre eles, o Decreto-Lei nº 37/1966[6] e o Regulamento Aduaneiro (Decreto nº 6.759/2009). Ambos com o mesmo texto legal, vemos que a denúncia espontânea teve sua redação definida na legislação aduaneira pelo Decreto-Lei no 2.472, de 1988, conforme abaixo transcrito:

“Art.102 – A denúncia espontânea da infração, acompanhada, se for o caso, do pagamento do imposto e dos acréscimos, excluirá a imposição da correspondente penalidade.

1º – Não se considera espontânea a denúncia apresentada:

a) no curso do despacho aduaneiro, até o desembaraço da mercadoria;

b) após o início de qualquer outro procedimento fiscal, mediante ato de ofício, escrito, praticado por servidor competente, tendente a apurar a infração.

2º – A denúncia espontânea exclui a aplicação de penalidades de natureza tributária ou administrativa, com exceção das penalidades aplicáveis na hipótese de mercadoria sujeita a pena de perdimento.” (grifamos)

Sem a intenção de esgotar tão relevante tema técnico e com o objetivo de tratar a denúncia espontânea nas operações aduaneiras, abordaremos sua aplicação com comentários às decisões administrativos sobre o instituto da denúncia espontânea no curso do despacho aduaneiro e a sua efetivação para excluir penalidades de natureza administrativa.

a) A denúncia espontânea no curso do despacho aduaneiro:

Vimos que a espontaneidade para fins de exclusão de responsabilidade infracional está relacionada intimamente com o desconhecimento por parte do Fisco acerca de eventual irregularidade e é o caminho para o contribuinte regularizar sem que haja punição. Para isso, o artigo 138, parágrafo único do CTN estabelece que:

“Parágrafo único – Não se considera espontânea a denúncia apresentada após o início de qualquer procedimento administrativo ou medida de fiscalização, relacionados com a infração”.

Pois bem. Faz-se necessário elucidar em qual momento se inicia o procedimento aduaneiro de maneira que encerre a espontaneidade. E, nesse sentido, é necessário aprofundarmos o entendimento acerca dos dispositivos legais que regulam as operações de importação ou de exportação de mercadorias.

Todas as mercadorias estrangeiras que serão importadas para o Brasil ou nacionais que serão exportadas para o exterior, estão sujeitas ao processo de despacho aduaneiro que, segundo o regulamento aduaneiro, é:

“Art. 542.  Despacho de importação é o procedimento mediante o qual é verificada a exatidão dos dados declarados pelo importador em relação à mercadoria importada, aos documentos apresentados e à legislação específica.” (grifamos)

“Art. 580.  Despacho de exportação é o procedimento mediante o qual é verificada a exatidão dos dados declarados pelo exportador em relação à mercadoria, aos documentos apresentados e à legislação específica, com vistas a seu desembaraço aduaneiro e a sua saída para o exterior.” (grifamos)

O início do processo se dá com o registro da respectiva declaração por parte da empresa importadora ou exportadora. Nesse sentido, considerando o despacho aduaneiro um procedimento definido pela legislação como instrumento para que fiscalização verifique a regularidade, presume-se que seu início impeça a espontaneidade até a sua conclusão. Com o desembaraço aduaneiro, é permitido que o importador retifique e se valha da denúncia espontânea[7].

Inclusive, o Decreto nº 70.235/72 que dispõe sobre o processo administrativo fiscal, corrobora tal entendimento com o disposto pelo seu artigo 7º:

“Art. 7º – O procedimento fiscal tem início com:

I – o primeiro ato de ofício, escrito, praticado por servidor competente, cientificado o sujeito passivo da obrigação tributária ou seu preposto;

II – a apreensão de mercadorias, documentos ou livros;

III – o começo de despacho aduaneiro de mercadoria importada.

§ 1° O início do procedimento exclui a espontaneidade do sujeito passivo em relação aos atos anteriores e, independentemente de intimação a dos demais envolvidos nas infrações verificadas.

§ 2° Para os efeitos do disposto no § 1º, os atos referidos nos incisos I e II valerão pelo prazo de sessenta dias, prorrogável, sucessivamente, por igual período, com qualquer outro ato escrito que indique o prosseguimento dos trabalhos.”

E pergunta-se: quando começa o despacho aduaneiro de mercadoria importada?

A resposta pode ser encontrada no artigo 545 do Regulamento Aduaneiro (Decreto nº 6.759/2009) que define o registro da Declaração de Importação como início do procedimento, conforme a seguir:

“Art. 545.  Tem-se por iniciado o despacho de importação na data do registro da declaração de importação.”

Nesse sentido, portanto, uma empresa importadora, ao registrar sua Declaração de Importação e identificar uma irregularidade, não poderia fazer jus à benesse da denúncia espontânea. Façamos a leitura dessa afirmação através de questionamento pautado por um exemplo: empresa importadora registra sua DI, identifica apontamento diverso na quantidade antes da parametrização, registra a retificação da DI, deve recolher multa?

Presumo que a resposta de muitos será positiva, mas há quem diga o contrário: a Terceira Turma da Câmara Superior de Recursos Fiscais, em julgamento do Recurso nº 303-124728, em março de 2004 proferiu o seguinte julgado:

“DENÚNCIA ESPONTÂNEA – ART. 138 CTN – PROCEDIMENTO EXCLUDENTE DA ESPONTANEIDADE.

Dispõe o § único, do artigo 138, do C.T.N., que não se considera espontânea a denúncia apresentada após o início de qualquer procedimento administrativo ou medida de fiscalização, relacionados com a infração. O início do Despacho Aduaneiro de Importação (Registro da D.I.), em que pese o disposto no art. 7º, inciso III e §1º, do Decreto nº 70.235/72, não se enquadra em tal dispositivo do C.T.N., pois que não se trata de procedimento ou medida fiscal relacionados com a infração. Reconhecida a espontaneidade da denúncia praticada pela Contribuinte, para fins de exclusão de penalidades (multas de mora e/ou de ofício), em obediência ao citado art. 138, “caput”. Recurso negado.” (grifamos)

Segundo entendimento do e. Relator do processo acima, o parágrafo único do artigo 138 do CTN que define quando há a perda da espontaneidade, deveria ser aplicado exclusivamente na apuração de infração. E, como o registro da DI não se encaixa em tal definição, há que se permitir a denúncia espontânea para esses casos.

Merece destaque o fundamento apresentado:

“Pode-se entender, entretanto, que a Decisão enfocada consubstancia o entendimento de que somente no caso de início de procedimento específico de apuração de infração, conforme previsto no parág. único, do art. 138, do CTN, é que se concretiza a perda da espontaneidade do contribuinte para a realização da denúncia respectiva.

Evidentemente que o registo da Declaração de Importação, que configura o início do despacho de importação, não se reveste da condição estabelecida no § único, do art. 138, do CTN, uma vez que tal procedimento não encaixa nesse dispositivo legal, não estando, efetivamente, relacionado com a infração.

Além do mais, releva notar que o próprio procedimento de despacho aduaneiro – Declaração de Importação – comporta a sua correção e alteração, por meio da competente Declaração Complementar de Importação – DCI.

Portanto, torna-se evidente que o simples registro da D.I., em que pese o estabelecido no mencionado art. 7º, inciso III, §1º, do Decreto nº 70.235/72, não tem o condão de sobrepor-se ao § único, do art. 138, do C.T.N., par afins de não se considerar espontânea a denúncia apresentada pelo contribuinte após tal registro, uma vez que não se trata de “procedimento administrativo ou medida de fiscalização relacionados com a infração”.

É fato concreto que o contribuinte, antes de ter conhecimento do início de qualquer procedimento administrativo ou medida de fiscalização, diretamente relacionados com a infração, dirigiu-se à repartição fiscal e, espontaneamente, confessou o erro e promoveu a liquidação da diferença de imposto recolhido a menor, com atualização monetária e pagamento de juros de mora, satisfazendo, desta forma, sua obrigação tributária para com a Fazenda Nacional, em decorrência da importação envolvida.

A situação enquadra-se, perfeitamente, na hipótese prevista no “caput”, do art. 138, do CTN, não se configurando a situação estabelecida no § púnico, do mesmo artigo.

(…)”

Sendo assim, ainda que a Declaração de Importação seja o marco inicial para o despacho aduaneiro e, por definição legal, encerre a espontaneidade, é forçoso reconhecer que o efetivo conhecimento de eventual irregularidade na operação somente ocorrerá após a parametrização dada pelo sistema e distribuição ao Fiscal responsável para análise. Nesse sentido e avaliando o contexto da efetiva perda da espontaneidade, uma retificação poderia fazer jus à benesse da denúncia espontânea para o não pagamento de multa, ainda que disposto contrário pela legislação.

Tal afirmação tem caráter teórico, pois na prática da operação, haveria que se discutir tal mérito em processo administrativo e/ou judicial acerca do tema.

b) A denúncia espontânea para excluir penalidades de natureza administrativa nas operações aduaneiras:

Com a redação dada Lei nº 12.350, de 2010, o parágrafo 2º do artigo 102 do Decreto-Lei nº 37/66 passou a permitir a denúncia espontânea para penalidades de natureza tributária ou administrativa.

E, conforme dispõe o artigo 237 da Constituição Federal, é prerrogativa exclusiva do Ministério da Fazenda o controle e fiscalização das operações de comércio exterior de modo que eventual irregularidade poderá envolver penalidades administrativas relacionadas exclusivamente ao controle.

Para interpretação da aplicação da denúncia espontânea às penalidades de natureza administrativa que não possuam recolhimento de tributos, mas tão somente correção formal, a Receita Federal do Brasil proferiu, no dia 30 de maio de 2016, a Solução de Consulta Interna nº 08 – COSIT com a seguinte ementa:

“DENÚNCIA ESPONTÂNEA. PENALIDADES PECUNIÁRIAS ADMINISTRATIVAS.

Somente é possível admitir denúncia espontânea, tributária ou administrativa, se não for violada a essência da norma, suas condições, seus objetivos e, consequentemente, se for possível a reparação.

Inadmissível a denúncia espontânea para tornar sem efeito norma que estabelece prazo para a entrega de documentos ou informações, por meio eletrônico ou outro que a legislação aduaneira determinar.

Dispositivos legais: Art. 138 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 (Código Tributário Nacional), art. 102, § 2º, do Decreto-Lei nº 37, de 18 de novembro de 1966, com redação dada pelo art. 40 da Lei nº 12.350, de 2010, e art. 683, § 2º, do Decreto nº 6.759, de 5 de fevereiro de 2009, com redação dada pelo Decreto nº 8.010, de 2013.” (grifamos)

Fazendo um paralelo com o arrependimento eficaz e posterior no Código Penal, a fiscalização fundamenta que a denúncia espontânea deve, necessariamente, estar relacionada com a reparação voluntária do dano pelo infrator. Desse modo, entendeu a fiscalização que não há que se falar exclusão de multas por infrações de caráter não pecuniário na legislação aduaneira.

Conclui-se, portanto, que a Receita Federal utilizou o entendimento doutrinário conflitante acerca da aplicação da denúncia espontânea em casos de obrigação acessória para definir que, caso não haja reparação pecuniária da infração, o interessado não poderá se valer da denúncia espontânea.

Como vimos no início, há entendimento doutrinário definindo que a denúncia espontânea não está relacionada com o pagamento de tributos, uma vez que a legislação se vale do termo “se for o caso” no artigo 138 do CTN. Inclusive, considerando que as informações aduaneiras de natureza aduaneira são relevantes ao dia-a-dia das operações, haveria que se deferir tal benesse.

Vejamos que esse entendimento é corroborado pela jurisprudência:

“(…)
Devido ao necessário grau de rigor na gestão da atividade aduaneira, imprescindível para que a entrada e saída de bens e mercadorias no território nacional se dê de forma correta, a legislação pertinente ao comércio exterior é pródiga na instituição de obrigações formais a serem cumpridas por todos aqueles que executam atividades aduaneiras. E visando assegurar o cumprimento dessas obrigações o legislador institui rigoroso sistema de penalização, que grava os diversos tipos de erro, mesmo que apenas operacionais e não dolosos, passíveis de ocorrência no curso do procedimento aduaneiro. […] A aplicação da denúncia espontânea no que se refere às obrigações acessórias aduaneiras é bastante relevante, e deve ser reconhecida pelas autoridades fiscais, de forma a se dar efetividade à intenção do legislador de privilegiar a boa-fé do administrado que declara espontaneamente o descumprimento de uma obrigação às autoridades aduaneiras antes de qualquer intimação por parte da Fiscalização. O incentivo que o contribuinte exerça o seu dever de colaboração é muito importante na seara aduaneira, já que o seu dinamismo e complexidade dificulta o trabalho da fiscalização, que conta com o cumprimento das obrigações pelo contribuinte para que o sistema funcione de forma correta”[8]. (grifamos)

Nesse sentido, vincular a utilização da denúncia espontânea à reparação de danos em uma área como a do comércio exterior que está totalmente relacionada com obrigações formais e acessórias para o andamento das operações, é impedir que o importador ou exportador possa demonstrar sua boa-fé, autorregularização, conformidade e impedir a correção dos erros – o que desmotiva o contribuinte à tais procedimentos.

  1. Conclusão

Há muito que se falar sobre a denúncia espontânea e sua aplicação é debate constante em questões de Direito Tributário. Ao olhar o mesmo instituto para a dinâmica do direito aduaneiro, concluo que não se pode tratar de uma única maneira – a autonomia das áreas faz com que as dinâmicas das operações sejam distintas e, por tal modo, as infrações.

Ora, nesse sentido, deveríamos tratar a denúncia espontânea no comércio exterior como excludente de responsabilidade não somente tributária, mas também aduaneira. Como vimos, obrigações tributárias podem ser bastante distantes de obrigações aduaneiras e, por esse motivo, haveria fundamento para impedir a aplicação de penalidades.

***

[1] Advogado graduado em Direito pela Universidade Católica de Santos (Unisantos), Pós-Graduado em Direito Internacional pela Escola Paulista de Direito (EPD) e em Direito Tributário pela Faculdade de Campinas (Facamp). Formado pelo SENAC Santos no Curso Intensivo de Comércio Exterior. Professor de Legislação Aduaneira na Central de Concursos, escola preparatória para concurso público. Professor convidado para aulas no curso de Pós-Graduação de Direito Marítimo e Portuário da Universidade Católica de Santos (Unisantos). Coautor do livro Direito Aduaneiro e Tributação Aduaneira em Homenagem à Jose Lence Carluci. Membro da Comissão de Direito Aduaneiro e Comissão de Compliance, ambas da OAB-Santos.

[2] PAULSEN, Leandro. Constituição e Código Tributário comentados à luz da doutrina e da jurisprudência – 18ª ed. – São Paulo, Saraiva: 2017, página 1052.

[3] REsp 1618348/MG, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 20/09/2016, REPDJe 01/12/2016, DJe 10/10/2016.

[4] SEIXAS FILHO, Aurélio Pitanga. Sanções administrativas tributárias. RFDT 21, maio-jun, 2006. In PAULSEN, Leandro. Constituição e Código Tributário comentados à luz da doutrina e da jurisprudência – 18ª ed. – São Paulo, Saraiva: 2017, página 1056.

[5] MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 36. Ed. São Paulo: Malheiros, 2015, p. 169. PAULSEN, Leandro. Constituição e Código Tributário comentados à luz da doutrina e da jurisprudência – 18ª ed. – São Paulo, Saraiva: 2017, página 1056.

[6] Dispõe sobre o imposto de importação, reorganiza os serviços aduaneiros e dá outras providências.

[7] “MULTA POR FALTA DE MERCADORIA. APLICAÇÃO DO INSTITUTO DA DENÚNCIA ESPONTÂNEA. Pedido de retificação de DI por falta e acréscimos de mercadorias constatadas pelo importador posteriormente ao desembaraço aduaneiro, acompanhado do pagamento da diferença de tributos e acréscimos legais, é cabível a aplicação do instituto da denúncia espontânea, na forma do art. 138 do CTN. Inaplicabilidade da multa cominada no artigo 521, inciso II, alínea “d” do Regulamento Aduaneiro (Decreto no. 91.030/85).” (DRJ/SP – 1ª T – ACÓRDÃO Nº 17-20312 de 13 de Setembro de 2007) (g.n.)

[8] CARDOSO, Alessandro Mendes; FABRE, Michele Giamberardino. Considerações sobre as multas vinculadas ao Siscomex carga. RDDT 219/7, des. 2013. In PAULSEN, Leandro. Constituição e Código Tributário comentados à luz da doutrina e da jurisprudência – 18ª ed. – São Paulo, Saraiva: 2017, página 1056.

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